Farei mais algumas considerações a respeito da tristeza derivada da perda por morte. Elas dizem respeito tanto à morte de pai e mãe como de filhos. Antes de tudo, é preciso dizer que se trata de situações bastante diferentes, uma sendo esperada e outra, a da perda de um filho, dramática e de superação muito difícil. (A idéia da morte dos nossos pais, quando já somos adultos e eles estão mais velhos, é algo que, de certa forma, nos perturba até mesmo antes de estarmos diante saber que são portadores de uma doença grave). A ansiedade provocada pela hipótese de que poderemos ser acordados no meio da noite com alguma notícia ruim nos faz sobressaltados quando o telefone toca depois do horário usual; isso pode nos acompanhar por anos a fio.
Quando a morte ocorre experimentamos uma forte dor, a sensação de não termos mais raízes, de estarmos perdidos e soltos no mundo. Isso afora a saudade e a falta que aquela criatura pode fazer em nosso cotidiano (e que depende da natureza do vínculo que persistiu ao longo da vida adulta). Sofremos muito e o luto se caracteriza pela incapacidade que temos de nos divertir. Por um tempo (oficialmente um ano, ou seja, o tempo de todas as datas comemorativas serem passadas sem sua presença) só conseguimos nos ocupar das tarefas cotidianas e daquilo que chamamos de trabalho. Meu ponto de vista é o seguinte: devemos tentar sofrer o mínimo de tempo possível. Ou seja, não acho que quem sofre por mais tempo e vive um luto fechado dá maiores demonstrações de amor por quem se foi.
Acho que pessoas mais maduras emocionalmente (as que lidam bem com frustrações e contrariedades) e as que desenvolveram uma docilidade diante da nossa condição de incerteza e de desamparo acabam funcionando como o “João Bobo”, aquele boneco que cai com facilidade, mas imediatamente depois se põe de pé. Ou seja, não consigo pensar que seja legal, digno, profundo e consistente o sofrimento pelo sofrimento. Ele deve ser tratado como inexorável, como algo a ser vivenciado de forma construtiva (aprender o que der para aprender daquela dor) e pelo menor tempo que conseguirmos. Superar o luto é o objetivo daquele que está sofrendo; não deveria se deixar embalar e muito menos se sentir engrandecido pelo sofrimento.
Sei que tudo isso é muito mais difícil quando se trata da perda de um filho, talvez a maior dor que se possa ter que passar nesta vida (especialmente quando o filho já é adulto e a gente não tão velha para ter uma relação de mais indiferença em relação à morte). A docilidade diante do destino que nos derrubou terá que ser maior ainda, a dor e o luto mais penosos; porém, penso que não adianta nada blasfemar e que o que temos que fazer é mesmo tentar seguir em frente e lançar mão de todas as nossas forças para tentar levantar o quanto antes. Se não conseguirmos fazê-lo sozinhos, devemos lançar mão tanto de grupos de auto-ajuda, como de medicamentos e psicoterapias
Flaviogikovate-psiquiatra